Final de ano chegando, época de grandes emoções, Black Friday, Cyber Monday, Natal e, dependendo da região, varejos vazios ou cheios, pressão por atingir as vendas, margem e garantir o resultado anual. Além de tudo isso, temos a gestão de orçamento no varejo, e o planejamento para o ano seguinte.
Ousadia x Irresponsabilidade na Gestão de Orçamento
Gestão de orçamento é sempre uma discussão delicada entre ousadia e irresponsabilidade, uma linha tênue entre o que é preciso fazer dentro do que é possível realizar. Sem devaneios.
Ousar é preciso, crescer é fundamental, rentabilizar é necessário, mas, no papel é fácil, colocar isto em prática é algo completamente diferente. A prática não necessariamente segue a teoria.
Se o objetivo é crescer, por exemplo, 7%, ou seja, apenas corrigindo a inflação estimada para 2022, e aumentar 1 ponto percentual na margem; este crescimento não virá de uma hora para outra. 31 de dezembro e 01 de janeiro é uma linha contínua, o mundo não mudou, os desafios não se tornaram mais fáceis, crescer de uma hora para outra apenas por que virou o ano e o orçamento manda, é passar a linha da ousadia. É começar o ano já abrindo o orçamento.
O mesmo vale para margem, crescer 1 ponto de uma hora para outra fará seu negócio ganhar cash margin? Se sua venda não vem, sua margem também não virá, e seu posicionamento perante o mercado? Como ficará? Sua competitividade? E sua estratégia de market share para o ano que se inicia?
Como aplicar a técnica “Bottom Up” na Gestão de Orçamento no Varejo
É preciso, antes de mais nada, fazer uma construção debaixo para cima, a famosa bottom up.
Qual a meta de market share que se deseja crescer? O quanto é estimado que o mercado cresça e o quanto o seu negócio quer ganhar participação?
Há abertura de novas lojas previstas? Estas lojas são receitas adicionais, o crescimento YoY (ano sobre ano) não deve contemplar estas lojas. Retomando nosso exemplo, se a meta é crescer 7%, este percentual é sobre a mesma base de lojas. Se haverão novas aberturas, a meta obviamente precisará ser maior que 7%, caso contrário a venda loja a loja será menor comparando com o ano anterior. Perde o sentido. Outro ponto para se avaliar, haverão novos entrantes nas praças que atua?
Se há abertura de novas lojas, sua mensalização deve conter um crescimento linear, contendo o mix de sortimento, tamanho de loja, concorrência local, avaliação de promoções para ganhar share nesta praça. Não se faz uma curva de venda mensal de nova loja apenas olhando a última linha de resultado, é preciso construir a venda e margem de forma coerente e alinhar os custos e despesas para este cenário. Não o contrário.
Quais os desafios por categoria para o ano que se inicia? Há problemas logísticos? Problemas de ruptura? Novos sortimentos? Novas categorias ou extinção de outras não rentáveis?
Qual o tamanho do seu estoque previsto para fechar o ano? Quantos dias de cobertura terá e qual a meta para o ano seguinte? Se a cobertura está alta, é preciso também controlar a compra e fluxo financeiro para alinhar o estoque para a nova meta de cobertura. Novamente, não se vira a chave de um dia para o outro, é preciso construir este ajuste na linha do tempo.
A Precificação no Processo de Gestão de Orçamentos
Precificação, se a meta é entregar 1 ponto percentual acima do ano que se encerra, é preciso antes de mais nada avaliar para onde vai sua competitividade perante o mercado.
O ganho de 1 ponto de margem será feito de acordo com sua curva de sensibilidade? Qual sua meta de margem para sua curva de super sensível, sensível e pouco sensível? Observe que a construção do orçamento requer uma visão multidimensional, loja, categoria, praças, categorias, sensibilidades, desafios de market share.
Tenha em mente que, ao construir o orçamento, é responsabilidade do planejamento segurar os ímpetos do desejo versus o conservadorismo na outra ponta, ousadia e irresponsabilidade, é papel do planejamento encontrar esta linha tênue entre ambas as pontas.
Colocado todos estes pontos, vamos detalhar a mensalização para o nosso exemplo de crescer 7% na venda e 1 ponto percentual na margem.
Tenha em mente que crescer 7% é ano, haverá meses que o crescimento deverá ser menor que 7% e outros deverá ser maior, coloque no papel também o calendário de feriados e eventos, pondere sua realidade e também acrescente a venda incremental de novas lojas gradativamente, novas lojas apresentam uma curva de venda crescente.
Na hora de colocar o incremento de margem, antes ir aumentando os preços, analise o quanto esta meta é absorvível no preço de venda e o quanto deve ser absorvido pelo time comercial e compras na redução de custos.
E colocando esta meta de redução de custos para o ganho de margem, tenha em mente que isto não virá da noite para o dia, há cobertura de estoque e precisa haver o giro para esta redução de custo ser visível. Se um item, por exemplo, tiver 60 dias de cobertura, e o time de compras cumprir sua meta de reduzir o custo do item, este resultado só será integralizado após 60 dias, quando houver o giro total do estoque com o custo antigo.
Orçamentos Realistas geram resultados alcançáveis
Na gestão de orçamento, as coisas não vêm da noite para o dia, muitos varejos se esquecem disto e partem do princípio que os desafios orçamentários serão atingidos logo no primeiro dia do ano, na primeira semana, no primeiro mês. Não virão.
Tenha em mente isto e terá um orçamento calibrado entre o desejo e a realidade, se na construção bottom up o número não foi atingido, documente os planos de ação para que seja, controle, cobre. O orçamento se torna realidade quando todos trabalham em prol de um desafio factível, realizável, se mantém a moral alta e se comemora pequenas vitórias.
Lembre-se que, uma gestão de orçamento construída erroneamente e aprovada, torna-se uma definição de orçamento correta e em cima dela todos serão cobrados. E números não serão atingidos.
Eduardo Martinelli é CEO da Thima Consultoria & Treinamento, executivo com 20 anos de experiência no varejo, trabalhando em grandes players do mercado na área de planejamento comercial. Certificado em data science por Harvard, especializado em estatística pelo IBMEC, pós graduado marketing pelo Mackenzie e formado em administração.